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Empresa é condenada por pressionar empregado a fazer acordo para rescindir contrato após acusá-lo, sem provas, de furto de mercadoria |
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Os julgadores da Nona Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG), por unanimidade, mantiveram a sentença que condenou uma empresa a indenizar por danos morais um empregado que, depois de ser acusado, sem provas, de furto de mercadoria, foi pressionado a aceitar acordo para rescindir o contrato de trabalho. Entretanto, o valor da indenização fixado em R$ 30 mil na sentença oriunda da Vara do Trabalho de Patrocínio foi reduzido para R$ 5 mil, montante correspondente a três vezes o salário recebido pelo empregado, por arredondamento, tendo sido dado provimento parcial ao recurso da empresa nesse aspecto.
Ao atuar como relatora do recurso, a desembargadora Maria Stela Álvares da Silva Campos apurou, pela prova testemunhal, que a empresa, do ramo de indústria e comércio de rações para animais, acusou o autor e um colega entregador pelo sumiço de 10 sacos de ração, o que, inclusive, gerou boatos entre os colegas. Apesar da inexistência de prova de que o trabalhador tenha furtado a mercadoria, em reunião realizada no escritório dos advogados da empresa, ele foi pressionado a aceitar acordo para rescindir o contrato de trabalho, com a proposta de receber verbas rescisórias em valor menor. Na ocasião, foi dito ao empregado que eles poderiam fazer acordo “e não mexer com esse ‘trem’ de delegacia”. Esse foi o teor da conversa extraída da gravação da reunião apresentada ao juízo, a qual foi confirmada na defesa da empresa. No áudio gravado, o procurador da empresa admitiu que o reclamante e o seu colega entregador foram acusados de terem furtado a mercadoria pela irmã do dono da empresa. Como observado pela relatora, o procurador tentou amenizar esse fato, sugerindo que "nem todas as pessoas têm esse preparo" e que, no sentimento, a gente fala mesmo. A prova testemunhal também amparou a concessão da indenização por danos morais ao trabalhador, confirmando os fatos por ele narrados. Uma testemunha afirmou que presenciou o filho do responsável pela filial, onde a mercadoria teria desaparecido, perguntando a outros empregados da matriz se o reclamante e seu colega já tinham sido dispensados em razão do "roubo" ocorrido. Outra testemunha, que também era um empregado da empresa na época dos acontecimentos, relatou que “ouviu comentário de que o reclamante tinha sido despedido por causa de roubo de ração da empresa; que, no momento, havia oito chapas (...) e estavam todos comentando sobre o assunto". Segundo pontuou a relatora, os depoimentos evidenciaram que a acusação feita ao autor se espalhou mesmo entre os colegas, apesar da ausência de qualquer prova de que ele teria praticado o furto, até mesmo diante da informalidade com que o negócio era gerido. “Como muito bem salientado na sentença, ‘a empresa gere o negócio de maneira informal e não tem controle da movimentação da mercadoria. Assim, o suposto desvio de 10 sacos de ração não passa de mera conjectura, sendo perfeitamente possível que o caminhão tenha saído da fábrica sem os sacos que faltaram para a entrega’”, ponderou a julgadora. A desembargadora ressaltou que essa informalidade ficou evidente na gravação, tendo em vista que o reclamante e seu colega afirmaram que não são emitidas notas fiscais, que nem sempre se colhe assinatura no momento da entrega e que as entregas são feitas mesmo sem a presença do cliente. Além disso, uma testemunha confirmou que não foram emitidas notas fiscais relativas à mercadoria em questão, o que, nas palavras da relatora, “só reforça a informalidade mencionada na sentença”. No áudio das conversas, o próprio procurador da empresa reiterou que, caso confirmado o desvio, não teria como saber quem seria o responsável. Apesar disso, ele afirmou que o proprietário da empresa queria "cortar todo mundo" e sugeriu a possibilidade de se fazer um "acordo e nem mexer com esse ‘trem’ de delegacia". Para a julgadora, apesar da afirmação de que se tratava de um mero acordo rescisório, pelas circunstâncias apuradas, ficou nítida a tentativa de intimidação do trabalhador. As palavras utilizadas pelo procurador da empresa chamaram a atenção da relatora nas conversas gravadas. Ele afirmou que nenhum empregado é obrigado a aceitar acordo rescisório, mas o empregador, diante da recusa, poderia dizer: "Não quer o acordo? Beleza! Então vou apurar na delegacia. Pronto.", acrescentando que o empregado tem a "opção" de não querer que os fatos sejam apurados na delegacia, querer sair da empresa "numa boa". No entendimento da desembargadora, a reunião não teve o objetivo de "esclarecer os fatos" e "questionar seus funcionários quando houver algum tipo de problema interno", como sustentou a empresa. “Pelo contrário, o reclamante, pessoa simples, foi chamado para uma conversa sobre suposto desvio de mercadorias, a ser realizada em um escritório de advocacia, portanto, fora da empresa, e mediada por uma pessoa que iniciou o encontro se apresentando como o advogado do grupo empresarial”, o que, por si só, é “intimidador”, destacou a relatora. Nesse sentido, a desembargadora confirmou o entendimento adotado na decisão de primeiro grau, transcrevendo, inclusive, trecho da sentença: "A reunião foi realizada sob o pretexto de colher informações e de apurar os fatos, mas tinha a finalidade evidente de pressionar os entregadores para obter a confissão do desvio da mercadoria, ou o pedido de demissão, ou uma rescisão mais barata, por mútuo acordo". |